O TACO
Redação
on
abril 30, 2022
TIAGO ADÃO LARA
11/10/2019
A IGREJA É NOSSA MÃE
26/10/2019
Por Rogério Medeiros Garcia de Lima
São-joanense e Desembargador do Tribunal de Justiça-MG
“A prosa é muito boa. O dono do boteco também participava das conversas. Taco era um sujeito dócil”
Dia 17 de outubro passado faleceu o amigo Eustáquio Carazza, conhecido como Taco.
Quando estou em São João del-Rei, gosto de andar pelas ruas e parar com conhecidos nas esquinas decantadas por Jota Dangelo. Mais ouço do que falo e mais observo do que sou observado. Atualizo assuntos da cidade. Revivo e aprendo coisas e “causos”. Recarrego as pilhas da alma e do coração.
Aos domingos, no final da manhã, agrada-me encontrar amigos no “Bar do Taco”, à Avenida Leite de Castro. As mesas são postas na passarela central da avenida. Faço exercício vendo as pessoas correr ou caminhar.
A roda é capitaneada pelo nosso líder Fernando Magno Mendonça. A maior parte dos frequentadores são futebolistas de São João del-Rei. Eu sou apenas comentarista e preparador físico.
A cerveja é bem gelada, acompanhada por saudáveis tira-gostos importados das cercanias: o Taco não fazia quitutes.
A prosa é muito boa. O dono do boteco também participava das conversas. Taco era um sujeito dócil, respondia às inúmeras provocações com bom humor e alguns palavrões inofensivos.
Muito católico, rezava todas as manhãs na grutinha de Nossa Senhora, perto da ponte do final da Avenida Antônio Rocha.
Eu recordo um sábado friorento do mês de julho, há uns três anos. Sentei-me em uma mesa do Bar do Taco. Ali pelas duas da tarde, aproximou-se, a passos leves e ligeiros, um magro e grisalho ancião. O Taco, à aproximação da personagem, nos preveniu:
– Esse velho é surdo e mudo. Todo dia, nessa mesma hora, vem aqui olhar o relógio. Coisa doida!
O ancião mirou um relógio de parede com o escudo do Flamengo – time do coração do Taco. Olhou para o dono do bar e este confirmou:
– São duas da tarde!
Ora, diabos: o velho não era surdo e mudo? Por que o dono do bar lhe falou as horas? Por que o velho fez cara de entender?
Do mesmo jeito furtivo com que se aproximou, o ancião se afastou, até sumir na primeira dobra de esquina.
Sorvi um longo gole da gélida bebida maltada e divaguei um pouco mais. Por que aquele ritual das horas? Para que o ancião quer as horas? O que ele faz das horas?
Então lembrei o diálogo de uma peça de Shakespeare:
– Que horas são, senhor?
– São horas de ser honesto.
Agora que o Taco se foi, eu recordo essa passagem meio fantástica. Faz sentido. O Taco era do bem. Era honesto. Vejo o Brasil. São horas de ser do bem. São horas de ser honesto.
Não vamos fechar o Bar do Taco.
Gazeta de São João del-Rei
Artigos Relacionados
- Category: Pelas Esquinas